Wednesday, February 6, 2013

Mímica



Recentemente fiquei sabendo da morte do grande mímico francês Marcel Marceau. O episódio me fez lembrar algo super interessante que ficou no fundo da minha memória.

Cenário - Colégio Estadual Prof Macedo Soares, na Rua Albuquerqe Lins, em São Paulo, década de 70. Não sei precisar o ano, pois os neurônios começam a brincar com a gente depois dos 40. Só sei que estávamos no auge da ditadura. De repente, chamam os alunos para o pátio. Devia ser algo importante. Será que era outra vacina contra meningite?

Não me lembro se todos os alunos do turno ali estavam. Os alunos presentes fizeram uma grande roda em volta de uma das quadras tortas do colégio. Sim, as únicas quadras tortas do mundo. Com um ângulo de pelo menos 4 graus. Mas isso não vem ao caso.

De repente aparece um soturno sujeito com a cara pintada, no meio da quadra. Não parecia palhaço. Começa a fazer algumas coisas às quais não estavamos acostumados. Crianças brasileiras da classe média baixa não tinham o costume de ir a teatros, embora existissem muitas peças infantis na cidade inteira, e de fato, o colégio ficasse a somente um quarteirão de um dos teatros mais tradicionais da cidade, o teatro São Pedro. Pintavam convites gratuitos, mas acho que teatro era visto com uma ponta de desconfiança pela classe média baixa da época. Podia aparecer o DOPS ou o Mariel Mariscot no meio de um espetáculo, acho que era esse o medo...

No começo, confesso que a coisa foi estranha. Pouco a pouco, fomos nos acostumando, e acho que no final a grande parte da criançada gostou daquilo, era mímica. Descobri que o nome do cara era Ricardo Bandeira.

Pois bem, o que tinha acabdo de acontecer, hoje tenho ciência, foi que fomos premiados com uma performance do Marcel Marceau brasileiro, Ricardo Bandeira. Não sei se o Ricardo tinha o costume de fazer isso em diversas outras escolas de São Paulo, mas o fato é que naquela tarde dos anos 70, fomos brindados com a visita de um grande artista brasileiro. Se você teve uma experiência similar, ou se estava na quadra torta do Macedo naquele dia, compartilhe com o resto do mundo!

Dalva Fontes Indiani


Uma das primeiras coisas que reparei na Dona Dalva é que ela não usava avental, como a Dona Ofélia. Tinha também uma caixa de giz toda cheia de nove horas. E quando fui comprar o livro de matemática da quinta série do Colégio Macedo Soares, aí realmente fiquei impressionado - junto com Lidia Condé Lamparelli e outras duas professoras, a Dona Dalva era co-autora do livro que usaríamos. Melhor - da série que usaríamos durante o resto do primeiro grau.

Um amigo notou uma certa tática da Dona Dalva que aterrorizava muita gente. Na hora de entregar as provas, ela devolvia de acordo com a nota do freguês. Os primeiros tinham as notas melhores, ou seja o método Darwiniano seguia a ordem descrecente, martirizando os alunos principalmente em salas grandes. Em suma, a devolução de provas era um evento e tanto - não recomendável para cardíacos. Em quatro anos de Dona Dalva, nunca fui o primeiro a ser chamado - cheguei perto uma vez, na primeira prova que fiz com ela. Tirei nove, mas uma menina conseguiu nove e meio. Foram os quinze minutos dela, coitada, pois no resto do ano não foi muito bem em nenhuma matéria. E acho que que na sétima série cheguei perto em uma prova, tirei 8,5.

Com tudo isso, livros da sua própria autoria, falta de jaleco, caixa de giz especial, entrega de provas em ordem decrescente, a Dona Dalva intimidava a gente um pouco. Mas no fundo eu gostava dela. Certa feita fiquei nervoso por que queria ir ao banheiro, e saí correndo da sala. Ela não entendeu nada, nem tampouco meus colegas ou eu mesmo. Ainda bem que terminou em pizza, não se falou mais do assunto. Não que o Macedo Soares tivesse algum psicólogo de plantão para examinar alunos com problemas.

Na oitava série ela teve que se afastar por alguns meses, e a sua substituta, uma jovem cujo nome nem me lembro, mal sabia pronunciar 'x' ou 'y'. Chamava o primeiro de 'sis' e o segundo de 'ipso'. Eventualmente a Dona Dalva voltou, concluindo o nosso ensino matemático do primeiro grau.

Suas provas geralmente tinham quatro questões, uma por página do papel de prova. Que eu me lembre, ela era razoável para dar notas, levando em consideração não só os resultados, mas também o raciocínio dos alunos. Suas aulas eram bem organizadas, e seguiam a estrutura do livro. Era fácil estudar, mas, segundo disse anteriormente, eu tinha um relacionamento assaz doentio com a matemática, portanto não aproventei tanto o ensino da Dona Dalva. Uma pena.

Tuesday, February 5, 2013

Dona Ursulina


Quando me propûs a escrever blogs sobre os meus ex-professores do Colégio Macedo Soares em São Paulo, quis fazer uma homenagem àqueles professores cuja influência na minha vida foi benéfica. Alguns por sua ética de trabalho, outros pelo entusiasmo e ainda outros pelo zelo e amor com que realizavam o trabalho mal remunerado. Em suma, gente que realmente influenciou minha vida de forma positiva, que me ensinou mais do que a disclipina acadêmica.

No meio do caminho, muitos ex-macedianos me cobraram textos sobre alguns professores que não faziam parte da minha curta lista. Ou seja, professores que não me influenciaram positivamente, que não considerava muito iluminados e cuja ética de trabalho, por diversas razões, era questionável. Mas tem alguns que são tão figuraços que é necessário mencioná-los para a posteridade.

Dona Ursulina. Não conheço nenhuma outra pessoa com esse nome, de repente era único dela. E certamente, houve poucas pessoas como a nossa exótica Ursulina. Lembro-me claramente dela entrando na sala da quinta série para se apresentar. Já com uma certa idade, vestia-se com claro desleixo estético assombroso, mesmo na época dos hippies, e maquiagem multicromática.

A primeira tarefa foi curiosa. Fez todos alunos comprarem (dela, obviamente) pequenas tiras de curvim para fazer marcadores de livros, pela bagatela de Cr$0.50. Só aí deve ter ganho o salário de um mês, multiplicando-se pelas centenas de alunos da escola. E de vez em quando repetia a dose, vendendo preciosos materiais para tarefas. Ursulinadirect.com.

Nossa estranha Ursulina tinha comportamentos sui generis, como trazer sanduíches de omelete embrulhados em jornal. Demonstrou um lado moralista que poucos conheciam. A professora de desenho foi escalada para acompanhar os alunos à Expo-Ex (Exposição do Exército) de 1972, e ficou muito indignada quando os alunos cantaram com vigor pueril, no ônibus, "Araruta, araruta, ê, ê, filha..." O resto dá para imaginar. Deu zero para todos alunos da classe. Pelo menos não entregou os alunos ao DOPS ou ao Para-SAR. Ocorre que eu e meu irmão não fomos nessa excursão, pois já tínhamos ido à tal Expo-Ex, mas ainda assim levamos o redondinho e rubro zero. Foi a única nota vermelha do coitado do meu irmão na sua carreira acadêmica, e os protestos fundamentados da minha mãe não foram ouvidos.

Uma vez agradei a Ursulina. Durante as férias de inverno de 1971, tivemos a tarefa de montar diversos poliedros, inclusive impossíveis dodecaedro e icosaedro, e enfeitá-los. Como o papelão era verde, fiquei um pouco frustrado com o resultado da pintura. Resolvi então cortar as faces de alguns poliedros, e coloquei dioramas miniaturizados dentro deles, com temas diversos, inclusive automobilismo. Ela ficou impressionada com minha criatividade.

Dois anos depois, a tarefa da pequena turma era criar um jornal. Quase todos alunos faziam a mesma coisa. Compravam exemplares da enciclopédia "Mestres da Pintura" para agradar a mestra e fingir que também gostavam dos clássicos das artes plásticas e colavam fotos dos quadros página após página, com artigos de outras publicações. Nada de material original. O 'jornal' era então circulado na classe até aparecer o exemplar seguinte. Achei tudo isso muito bobo, e fiz um jornal mesmo, escrevendo matérias sobre automobilismo, rock (com minha própria parada de sucessos), e sobre países distantes como Kuwait e Noruega. Resisti à tentação de colocar obras do "Mestres da Pintura", mas confesso que não me lembro da nota que levei pelo meu debut editorial.

Na realidade, embora eu gostasse muito de desenhar e de artes plásticas em geral (diziam que eu era bom), dona Ursulina não me incentivou o suficiente para "seguir carreira" ou aprimorar minhas técnicas. Depois de três anos de Dona Ursulina, eu já estava bem afastado do desenho e artes em geral, e só agora, quase quarenta anos depois, volto a namorar as nobres artes plásticas.

Do lado positivo, não embrulho sanduíches de omelete em jornal.

Dona Elza


Continuo a minha saga de blogs sobre professores do Colégio Macedo Soares de São Paulo, dos anos 70. Já que as escolas estigmatizavam os alunos com grupos A, B e C, digamos que o primeiro grupo de professores dos meus blogs era a classe A, e que daqui por diante, os professores são da classe B. Como sou bonzinho, não vou colocar nenhum professor na classe C e não vou reprovar nenhum deles, podem ficar tranquilos.

Dona Elza era professora de geografia. Muitos lembrarão dela por diversos aspectos, nenhum acadêmico. Primeiro, a vozinha finiiiiiiiiiiiiinha, que usava para dizer "Mininussshhhhh" com um sotaque faux carioca. Depois, pelos carrões que usava como transporte. Não sei exatamente por que a Dona Elza andava de Galaxie (vermelho) e depois de Dodge Dart. Acho que era bem casada, certamente não comprou esses carros com salário de professora... Morava em Higienópolis. Muitos lembrarão também das suas infindáveis palestras sobre a Alemanha. Sem dúvida, as aulas podiam ser chamadas de geografia da Alemanha, pois Dona Elza tinha uma filha que lá vivia, portanto, conhecia bem o país.

O material didático usado pela Dona Elza era legal, entretanto. Usava coisas chiques, estrangeiras. Me divertia muito com os mapas em relevo, de plástico. Também tinha um indicador de lousa colapsável que era grande novidade. Ainda lembro do plec-plec que fazia na lousa.

Confesso que eu tinha uns hábitos muito estranhos para crianças. Entre outras coisas, me deliciava em ver as páginas de commodities e mercados de valores dos jornais. Antes que você pergunte, não, nunca trabalhei nas Bolsas. Que talento perdido!! Com 11 anos eu conhecia os nomes de quase todas as companhias com capital aberto no Brasil embora não soubesse o que era OP, PN, etc. Cada vez que as ações da Acesita caíam eu ficava perturbado. Bem, voltando ao "causo". Entre as commodities, vi "mentol" listado. Cai na besteira de perguntar o que era, achando que a Dona Elza satisfaria minha curiosidade de operador de bolsa-mirim. Sua resposta? Obviamente não tinha a mínima idéia do que se tratava, mas não quis admitir. Me disse que eu teria que pesquisar o assunto e apresentar à classe. Acho que foi a última pergunta "acadêmica" que lhe fiz, a lição foi aprendida...

Apesar de tudo isso, Dona Elza tratava todos alunos bem. Poderia ser esnobe, pois obviamente vinha de um estrato social superior, mas tratava todos alunos com dignidade e carinho. O mesmo não pode ser dito da dona Ophélia...

Dona Ophelia


Há certos eventos traumatizantes na vida que são inevitáveis. Uma doença séria, enfrentar a morte de um ente querido, acabar um namoro. Coisas desse tipo. Quando comecei a escrever meus postings sobre professores do Colégio Macedo Soares em São Paulo, senti a inevitabilidade de ter que escrever sobre a dona Ophélia, uma das professoras da minha turma B de professores. Até onde pude, posterguei o suplício.

Aqui vai.

Para os que não conheciam a dita cuja, Dona Ophélia era baixinha, e acho que já tinha uma certa, na realidade bastante idade, pois tinha o hábito de ficar mastigando a gengiva. Falava muito alto. Quase berrava. Fazia questão de ser antipática e dar medo nos alunos, e não era lá essas coisas com adultos. Suas chamadas orais de sopetão devem ter feito muita gente urinar nas calças. Praticamente xingava os alunos, chamando-os de fedidos e postes (era assim que se referia a um pobre colega que era muito alto para a sua idade).

Além disso, já devia estar gagá e fazia erros. Na sexta série eu era muito quieto, mas o próximo número da chamada era de um colega que era um verdadeiro terror. Pois bem, certa feita os dois se desentenderam e a dona Ophélia deu um zero. Para mim, que não tinha feito nada!!! Em vez de dar zero para o seis, deu para o cinco. Nós dois tínhamos o nome Carlos Alberto.

Pedi para minha mãe falar com ela, mas foi reticiente, o "zerro erra prra ele" (Ela puxava o rrrrr, que dava maior impressão de braveza). Fiquei de exame final por 1,5 ponto por causa do tal 'zerro'. Me vinguei dela e obtive 8,5 no exame final. Não que ela tenha perdido sono com isso, mas para mim isso foi significativo.

O que mais detestava na Dona Ophélia (que muitos chamavam de peste velha, vejam só que injustiça) era a forma desrespeitosa com que tratava os humildes alunos da escola estadual. Pois a mestra de história, que muitos diziam ter testemunhado diversos dos eventos que relatava do Brasil Colonial, também era professora da Escola Dante Alighieri, escola particular frequentada pelo "high society" de Sampa. Duvido que lá se referisse aos alunos como fedidos ou postes. Até porque filhos de muitos políticos, empresários e militares frequentavam a escola, eram os anos Médici e a pequena professora poderia virar almoço de tubarão se ofendesse um filho de 'otoridade'. Assim, nós pagávamos o pato, o marreco, o ganso, o cisne etc.

Uma vez agradei a Dona Ophélia. Uma única vez. Ela examinava os cadernos de pontos dos alunos a cada dois meses, e pedia que preparássemos um mapa com determinado tema. Como eu gostava muito de mapas, me esmerei e fiz um mapa no estilo antigo, com anjinho soprando vento e tudo, e tentei fazer as bordas parecerem de papel velho. A professora ficou tão feliz com minha performance cartográfica que levou meu caderno de capa vermelha para expor na sala de professores. Entretanto, logo se acostumou com meu truque, e passei a ser mais um dos 'fedidos'. Daí desencanei, e passei a fazer mapas mais burocráticos.

É curioso que hoje em dia goste tanto de história. Não posso atribuir esse gosto a esta professora. Fiquei tão traumatizado com ela que, já no segundo grau, e estudando à noite, quase tive um chilique quando ela entrou na sala de aula. Desfeito mais este engano, pude relaxar e me despedir dela. Foi a última vez que a vi.

Dona Elda Baby


Este é mais um blog sobre os meus velhos professores do Colégio Macedo Soares.

Já pequenino nutria interesse por música. Compunha do meu jeito, letra e música, e um dos personagens favoritos que eu criei era um menino cantor. Mas eu gostava de música pop, ie-ie-ie, rock, não de hinos cívicos. Assim que o repertório da Dona Baby, professora de música, não se enquadrava muito no meu projeto musical.

Aprendemos hinos de todos os tipos. Além do Nacional e da Independência, aprendemos hinos do Soldado, da República, da Bandeira, do Exército, da Marinha, da Força Aérea, hino do Sesquicentenário...Até o Hino de Portugal. Só faltou o Hino do DOPS. O ano de 1972 seria o sesquicentenário da independência, e não poderíamos fazer feio.

Bem que tentei me livrar do orfeão, cantando atonalmente durante a audição, mas o truque não deu certo. O grupo ensaiava na frente da escadaria, e mandava ver ao ar livre. Ou seja, a cantoria não era segredo para ninguém.

O vozeirão da Dona Baby era de assustar. Mais grave do que a maioria dos homens que já conheci. Acho que só o Oriel Villela (16 TONELADAS) cantava ou falava mais grosso.

Certa vez fizemos a professora passar vergonha. Ela ensaiou uma pequena música cuja letra era "Salve, ó pátria brasileira, pela data festiva e querida. Pela tua, independência." Entre o tua e independência tinha uma curta pausa. Para enfatizar, ela nos ensinou a contar UM mentalmente  "Pela tua,(UM) independência." Pois bem, no dia da apresentação, perante todos os professores, a meninada cantou o "UM" não só audível, como forte. A coitada da professora ficou rubra de vergonha, mas acho que nenhum dos outros professores se importou com o faux pas.

Nem só de hinos cívicos vive um professor de música, mesmo no governo Medici. A professora também gostava de um compositor de valsas populares da época, Sergio Bittencourt, e ficou visivelmente muito emocionada quando os professores pediram bis de uma performance do órfeão de uma dessas músicas. Parecia que tinha ganho o Festival da Record.

Professor Rui Gutierrez


Resolvi que passo muito tempo criticando, avacalhando, comentando sobre pessoas que nem conheço. Afinal de contas, não é para isso que existem blogs? Para todo mundo parecer "insider" e entendido em tudo? Mas também reparei uma outra coisa. Há tanta gente super legal, que fez tanta coisa pelos outros seres humanos, mas, por não ter nascido na época certa simplesmente parece que nem passARAM pela terra. Entretanto, qualquer artista, desportista, empresário, político de dúbia qualidade gera milhares, ás vezes milhões de hits no google, se for da geração certa, lógico. Isto cria uma visão cada vez mais distorcida do mundo, da importância de certas funções. Resolvi homenagear meus professores, muitos dos quais já devem ter falecido e que permanecem anônimos na Internet.

Sou suficientemente antigo para ser de uma geração que se orgulhava de estudar em escola estadual em Sampa. Os exames de admissão eram difíceis, os currículos fortes, e os professores bons. Muitos dos professores da minha escola, o Colégio Macedo Soares, na Barra Funda, tinham nível suficiente para dar aula em faculdades, e pelo menos um dava aulas na Unicamp.

Quando o Prof. Rui foi meu professor, já era idoso. Quer dizer, idoso para uma criança pode até ser um homem de 50 anos. Quase a minha idade agora. Ai, ai. Será que já sou idoso? Bem, para mim já parecia idoso, e quem sabe me afeiçoei por ele por ser um avô próximo que nunca tive. Via meu avô Antonio pouquíssimas vezes por ano e acho que sentia falta desse contato

Não eram todos os alunos que gostavam do professor Rui, por que ele era rígido. Rígido como a gramática que ensinava. Mas certamente foi ele que me deu o gosto pelas letras e a ordenar os pensamentos, e quem diria, um dia eu ganharia a vida escrevendo. E escrevendo português nos Estados Unidos, como tradutor. Ou seja, ele foi importante na minha formação.

Foi meu professor no primerio ginasial e no primeiro colegial. Neste último ano, teve que ocupar o cargo de diretor do colégio, e foi substituído pelo professor Terra, o Terrinha, verdadeira figura carimbada.

Uma das grandes características do prof Rui era a sua integridade. Lembro-me que certa feita, em uma aula de literatura, era a vez do meu irmão ler. Um poema do Vinicius de Moraes. A certa altura, o poema tinha uma palavra de baixo calão, mas para não deixar o meu irmão numa situação embaraçosa, o Prof Rui leu a palavrinha de quatro letras. E  apesar da palavrinha ferir os seus princípios, decidiu livrar a cara do aluno, demonstrando muita integridade. Se não me falha a memória, ficou ruborizado. Bastante vermelho.

Para o prof. Rui deve ter sido difícil, por que, depois descobri, muito provavelmente era evangélico. Foi através dele que recebi meu primeiro Novo Testamento, dos Gideôes, apresentados por ele na escola.

Assim era o prof. Rui. Às vezes ranzinza, não muito dado a sorrisos, mas doce, à sua maneira. Uma vez fiquei muito orgulhoso quando ele me pediu que fosse à cantina comprar um sanduíche de queijo para ele. Cumpri a tarefa com muito gosto, pois ele merecia.  E era o único professor que tinha um jaleco cinza.

Professor Almerindo Marques Bastos


Este é o segundo da minha lista de professores do Colégio Macedo Soares em São Paulo. Achei que estava sendo meio negativo, falando mal de pessoas que nem conheço, e percebi que era hora de falar bem de pessoas que fizeram muito, mas que são anônimas na Internet. Meus professores. Chega de Ana Paula Oliveira, Xuxa, Jo Soares, Richarylson. Já falam demais desse pessoal.

O magérrimo Professor Almerindo tinha cara de professor. Já meio careca, com aparência pálida, com óculos e bigodão, poderia ter feito o papel de professor em qualquer filme. Era professor de matemática, e, sem dúvida, diferenciado. Pois foi o Professor Almerindo que mais entusiasmou meu irmão para uma carreira acadêmica, segundo ele mesmo me admitiu anos mais tarde.

As aulas do prof. Almerindo eram bem estruturadas, de um nível mais alto do que eu esperava para o primeiro colegial. Certamente seriam assim as aulas em faculdades, pensava eu. De fato, o Professor Almerindo dava aulas numa instituição superior em Campinas, depois de bater o ponto (e entenda bem, ralar) na humilde escola estadual da Barra Funda.  Sempre tive um relacionamento de ódio e amor com a matemática. Ás vezes éramos amigos, e às vezes ficávamos de mal por muito tempo. Durante o meu ano de Almerindo, tive o prazer de tirar 8,5 numa prova, mas foi o meu momento de glória. Fiquei de exame final.

O que mais me impressionava no Professor Almerindo era o fato dele morar em Santos e já estar pronto para o trabalho na primeira hora do turno da manhã. Que disposição! E depois se descambava para Campinas. Não é à toa que o homem era pálido. Algumas vezes nos encontrou caminhando para a escola, na Barão de Campinas, com seu Fusca azul claro, e nos deu carona ao Macedo.

Havia histórias de que o Prof. Almerindo jogava o apagador em quem não estivesse prestando atenção nas aulas. Nunca presenciamos esta didática apurada por que havia uma aluna repetente na nossa sala que supostamente teria reclamado do inusitado despertador à diretoria, que lhe pediu para pegar leve. Confesso que eu temia o torpedo, pois  gostava de pensar na morte da bezerra durante as aulas, e certamente teria sido alvo fácil do petardo. Nunca agradeci a menina, pois provavelmente eu teria levado algumas apagadas na cabeça.

 

BARBARA THEOTO LAMBERT.


Dizem que uma das virtudes do Paulo Maluf é que uma vez uma pessoa lhe é apresentada, o político nunca mais esquece o seu nome. Podem se passar cinco minutos, vinte dias ou 35 anos, o homem usa memória mnemônica ou sabe-se lá que outra tática para guardar centenas de milhares de nomes. Uma pena que acaba não sobrando espaço para lembrar onde deposita dinheiro, mas isso é outra história.

Pois tenho um amigo Paulo que tem uma memória muito boa para nomes, e foi ele quem lembrou do nome completo da nossa professora de inglês do Colégio Macedo Soares, de São Paulo.

Seria uma injustiça se eu não homenageasse a Dona Barbara, afinal de contas, devido a sua dedicação me virei rapidamente com o inglês ao chegar nos Estados Unidos em 1976. Falar, não falava nada, por minha culpa, e não dela. Mas lia e escrevia bem, acreditem ou não, melhor do que muitos colegas de High School que nasceram aqui.

Dona Barbara era dedicada, e trazia cartazes, alguns bem feitos, outros terríveis, um trambolhoso gravador com músicas de diversas eras, transcrevia letras de músicas e os recursos que podia para nos ensinar inglês. Fez com que comprássemos um caro dicionário Webster inglês-inglês, o que na época não fazia muito sentido, mas hoje faz muito. E é justo com os meus conhecimentos de inglês e português que ganho a vida - há vinte e cinco anos.

Dona Barbara tinha verdadeira paixão por seu filho Joaquim, acho que a única coisa que gostava mais do que ensinar. Também dizia que era parente da Eloisa Mafalda, atriz da Globo já naquela época, mas nem todos acreditavam nisso. Até que se pareciam as duas. Um pouco, com certa liberdade poética.

Enfim, os três anos de Dona Barbara me deram uma forte base de inglês, com muitos exercícios escritos e bom aproveitamento nas salas pequenas. Obviamente, nas salas grandes a coisa ficava mais difícil, mas a culpa também não era dela.

Dona Barbara foi um senhor exemplo também, por superar adversidades e não deixar que isso atrapalhasse a sua performance. Quem diria que iríamos nos tornar colegas...

Dona Sonia


Continuo a minha saga de homenagear alguns dos meus professores do Colégio Macedo Soares em São Paulo. Hoje vou falar sobre a Dona Sonia.

O ano era 1973, e eu não era muito bom para julgar idades. Mas acho que a Dona Sonia tinha saído da faculdade há poucos anos. Que era jovem, isso lá era.

Nossa sala da sétima série era pequena, parte de um experimento pedagógico, e naquele ano Dona Sonia era a nossa professora de ciências. Depois de dois professores indiferentes, na quinta e sexta séries, dona Sonia foi um choque. Muito entusiasmada, sua ciência predileta era obviamente a biologia, que ela ensinava com visível empolgação.

Apesar da falta de um laboratório operacional (o laboratório existia, mas ficava fechado!!!) dona Sonia arranjou diversos animais para dissecar e dar aulas de anatomia. Não me lembro se ela pedia contribuição da classe ou se tirava o dinheiro do próprio bolso. Mas me lembro do simpático sapo Joca, que foi devidamente anestesiado para seu sacrifício acadêmico, e de uma pomba. Acho que rolou algum mamífero também.

Além disso, tivemos que preparar um insetário, um projeto vultoso. Eu e meu irmão tínhamos um grande trunfo - nosso tio tinha um sítio lá em Parelheiros, e catou um coleóptero bem grande. Tão eficaz era dona Sonia que lembro até hoje os nomes das famílias de insetos.

Infelizmente, dona Sonia não ficou além daquele ano no Macedo Soares, e certamente fez grande carreira docente. Provavelmente ensine até hoje, pois era, como disse, bastante jovem.

Só digo uma coisa. Se os meus professores de geologia na faculdade tivessem a metade do entusiasmo da dona Sonia, hoje em dia eu seria um dos melhores geólogos do mundo!

Infelizmente nunca soube o sobrenome desta grande professora.

O sanduíche de queijo


É incrivel como as coisas assumem ângulos diversos, dependendo de situações e pessoas.

Já escrevi em certa ocasião sobre o meu professor do Colégio Macedo Soares em São Paulo, o Rui Gutierrez, o austero mestre de português da quinta e da primeira série do segundo grau. Sei que nem todos gostavam dele, devido à sua falta de humor e extremo rigor. Mas quem foi seu aluno sem dúvida sabe do seu valor como professor, e como pessoa, transpirava integridade. Eu gostava dele, e pronto.

Pois certa feita, o professor Rui me chamou. Queria me pedir um favor. Me deu um dinheiro e pediu que lhe buscasse um sanduíche de queijo na cantina. Lá fui eu todo feliz à cantina do Manolo, genuinamente grato por que o professor me escolhera para ajudar a saciar a sua fome. Fui correndo, mais do que quando ia buscar alimento para mim mesmo. O professor me agradeceu, mas não me lembro de ter sorrido. Não era chegado a essas coisas.

Um tempinho depois uma professora pediu a mesmíssima coisa. Admito que nem lembro o nome verdadeiro dela, só o apelido. O apelido era Susi, por que ela era loura, e tão bonita quanto a boneca da Estrela. A Susi era professora de física, e achava muita graça por que eu escrevia as anotações no caderno sem olhar para o dito cujo. Mal sabia ela que não olhava o que estava escrevendo para poder olhar um pouco mais para ela!!!! Não é que um dia a Susi também me pede para pegar um sanduíche de queijo?

Se com o professor Rui eu fui correndo, com a Susi eu fui voando, com o meu adolescente coração batendo a mil por hora. Se eu fosse de briga era capaz de ter batido em algumas pessoas para furar a fila e trazer com mais rapidez o repasto à minha amada e faminta professora. Voltei correndo e entreguei o sanduíche, que foi recebido com um sorriso, que, obviamente, quase me dá um ataque cardíaco, apesar da pouca idade.

Vejam só, um humilde sanduíche de queijo pode significar tanta coisa  diferente...    

EXCURSÕES DO PROFESSOR CHICÃO


Como o mundo dá voltas... Apesar de seis anos de Colégio Macedo Soares, em São Paulo, 32 longos anos após sair da escola descobri que as excursões do professor Chicão eram famosas!!! Descobri isso na comunidade de ex-alunos da escola no orkut. O endereço da comu é  http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=736907.

Parecia que o pessoal se divertia muito nas tais empreitadas, e que o professor, apesar das desvantagens de trabalhar no sistema público e até mesmo de se movimentar, descolava boas visitas a fábricas e empresas de modo geral.

Só tive o prof. Chicão durante um curto período, questão de poucos meses. A nossa professora de geografia do primeiro colegial, Dona Miriam, estava gravidíssima, e o veterano Prof. foi chamado para substitui-la na hora 'H'. Em outro blog conto como foram as minhas experiências chicãozísticas. Aqui quero me concentrar na única micro-excursão que tivemos com o famoso e exótico professor.

Acho que por estar um pouco idoso, em 1975 o professor Chicão já não estava muito a fim de alugar ônibus (embora aparentemente usasse ônibus de linha nas suas entradas e bandeiras) e organizar uma excursão no Padrão Chicão de Qualidade. Quem sabe, por nossa turma ser muito pequena, seria difícil alugar um ônibus. Por essa mesma razão seria mais fácil manter controle da gurizada. Não sei quais foram os motivos, mas a nossa excursão foi, de fato, mixuruca. Visitamos o posto de saúde que era vizinho do Macedo Soares!!!!

Deu para matar a curiosidade. Nunca tinha adentrado os recônditos da misteriosa repartição. Só me lembro vagamente de ter ido lá para receber uma vacina contra meningite, em 1974. A gente sempre ficava imaginando o que rolava lá dentro - pelo menos eu tinha essa curiosidade. Na realidade não rolava nada de muito interessante. De fato, coisas mais chocantes ocorriam no Pronto Socorro da Barra Funda, que ficava na frente do Macedão, na esquina da Albuquerque Lins e Vitorino Carmilo. Ali de vez em quando chegava algum cara que tinha levado um tiro, facada ou coisa pior, já que a delegacia do terceiro distrito policial ficava a poucos quarteirões do P.S.

O fato que mais lembro da mini-excursão, e também o mais engraçado, foi que a certa altura do campeonato o Prof. Chicão tentou arrancar uma consulta grátis do médico escalado para atender o grupo, dizendo que tinha dores aqui, acolá e por aí afora (ou adentro). O médico não gostou muito da situação, mas até o último momento o nosso valente professor continuou a sua tentativa de fazer uma consulta sem marcar horário.

Ora, as batatas.